segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Fórum Social Mundial 2009 - Balanço I

Mais de 130 mil quiseram um outro mundo
Em seis dias participaram em mais de três mil actividades. Acabou a "confusão alegre"
Os números impressionam pela dimensão: o Fórum Social Mundial (FSM) que, este domingo, terminou em Belém do Pará, Brasil, reuniu 133 mil participantes de 142 países, incluindo 1900 indígenas de 120 nações, para um total de 3210 actividades inscritas – apesar de nem todas se terem realizado. Outro número curioso: participaram ainda três mil crianças e adolescentes, num espaço especialmente preparado para o efeito.
A organização do evento envolveu também mais 17500 pessoas no trabalho voluntário de apoio, expositores, artistas, jornalistas e outras sete mil na segurança, incluindo a Força Nacional de Polícia.
Estes dados foram apresentados por Cândido Grzybowski, do comité organizador do FSM, numa conferência de imprensa final, onde este fundador do fórum, explicou aos jornalistas o facto de não existir uma declaração final: "Não queremos fazer velha política, cada um tem de assumir a sua responsabilidade, a partir do lugar onde está".
Para Grzybowski, o futuro passa por aqui, e não por Davos: "Tem que se olhar para aqui para se ver mais o futuro, não para o velório do Fórum Económico Mundial" (FEM) [de Davos]. Afinal, insistiu o responsável, "conseguiu-se desde o FSM de 2002 mudar a agenda do FEM": primeiro, a pobreza, depois a violência, agora a questão palestiniana.
As actividades finais concentraram-se este domingo na Universidade Federal Rural da Amazónia (UFRA), onde pela manhã se realizaram 16 das 22 assembleias de temas específicos (as outras seis tiveram lugar na Universidade Federal do Pará – Ufpa) e, à tarde, a grande "assembleia das assembleias", onde se fez a síntese das reuniões da manhã. Acabado o fórum, foi a debandada. A chuva apareceu antes, certinha, pela tarde.

Fonte Informativa: FÁTIMA MISSIONÁRIA 02-02-2009

" Fórum não tem mais tanta importância"
Belém, Domingo, 01/02/2009
Fonte Informativa (notícia abaixo): ORM - Brasil
Edição de 01/02/2009
Opinião - É o que diz geógrafo norte-americano sobre os efeitos concretos do evento
Só mesmo um nome tão importante no ativismo social como o geógrafo David Harvey para atestar que o Fórum Social Mundial (FSM) já não tem mais a mesma importância de antes. Se a famosa máxima de Socrátes 'mais sábio é aquele que sabe que não sabe' for mesmo verdadeira, ela não se aplicaria a ninguém melhor do que a ele. Em uma mesa de discussão sobre a reforma urbana e em entrevista a O LIBERAL, Harvey respondeu muitos 'não sei', sem vergonha e sem culpa, e criticou a forma como tentamos importar modelos de luta e mobilização.
O senhor idoso, de 80 anos, com cara de bom avô, passou despercebido durante a semana pela Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), onde caminhava, no sol escaldante de 13 horas, atrás de um almoço. Os representantes de movimentos sociais e de sem-teto aclamavam suas palavras anti-capitalistas e poucos deles sabiam a importância de Harvey para os estudos sobre mudanças na construção econômica e social contemporânea.
A pouca movimentação de imprensa que estava no local, talvez por desconhecimento, desviou todas as atenções da tenda quando o famoso téologo Leonardo Boff passeava nas redondezas. Harvey foi um grande 'ilustre desconhecido', que os participantes do Fórum Social Mundial não quiseram ou não souberam aproveitar. Ignorância sobre uma biografia extensa, que não pode ser resumida facilmente, até por que David Harvey tem importâncias distintas em cada um dos continentes.
Professor aposentado da Universidade de New York, ele é referência no campo dos estudos urbanos. Direito à moradia e espaço territorial são dois de seus grandes temas de estudo, mas o autor de livros como 'A produção capitalista do espaço' e 'Condição pós-moderna' é estudado no Pará, por exemplo, nos cursos de Comunicação Social.

OPINIÃO
'Acho que quando o fórum começou ele era muito mais importante em muitas áreas, mas agora, com o tempo, ficou mais disperso. Realmente, os fóruns locais são mais importantes que esse. Deixam os interesses mais próximos, com maior discussão', sentencia o geógrafo acerca do evento no qual palestrou. Harvey foi convidado para vir a Belém pela organização não-governamental (ONG) internacional Action-Aid, que luta em favor dos direitos humanos e contra a pobreza.
Para Harvey, esta edição do Fórum Social tem duas importantes contribuições: 'aproximar os grupos que vivem na Amazônia' e 'apresentar mais ainda a Amazônia para o mundo'. 'A importância desse Fórum é muito mais nacional, para facilitar a comunicação dos povos que vivem aqui e estão distantes e ainda ensinar sobre a Amazônia, sobre as pessoas que a defendem. Aprendi aqui sobre eventos como o assassinato do Chico Mendes, a luta que ele tinha', declara.
'Minha resposta é: eu não sei!'. Foi assim que Harvey respondeu quando questionado sobre qual seria o futuro de povos tradicionais em meio às mudanças econômicas e social e a tentativa de homogeneização cultural. 'Compreender esse futuro é muito difícil. De um lado eles querem alguns benefícios da globalização, bom atendimento de saúde, educação de qualidade, mas não querem ser integrados ao sistema. É uma posição contraditória. Simpatizo muito com as diferenças culturais, mas serão vocês quem precisam responder, como resolver esse problema', afirma.

IMPORTAÇÃO
Harvey critica a excessiva exposição da imagem de político democrático e inovador criada sobre Barack Obama e diz que é necessário aprender com o que é criado dentro do próprio País e não esperar modelos de como fazer vindo de fora. 'Vocês são democráticos, têm leis que jamais existiriam nos Estados Unidos. Têm leis que garantem o direito à cidade, as exigências que ela deve cumprir. Essas leis existem aqui', destaca o pesquisador, completando, com um sorriso, que 'o problema é que sabemos que elas não são cumpridas'.
O geógrafo elogia o modelo de luta pela reforma urbana no País, feita por entidades como o Movimento Nacional de Luta pela Moradia. 'Vocês são muito mais organizados, mais articulados. Conseguem uma abordagem integrada, com transporte, moradia, saúde. Eu é que vou importar o modelo do Brasil para os Estados Unidos', ironiza. Sobre a crise, David Harvey diz que mais do que qualquer expectativa, tem uma grande esperança. 'O projeto neoliberal foi um sucesso, com sua formação centrada no individualismo. Agora, espero que a crise possa recriar novas formas de solidariedade'.

Muito barulho e pouca inspiração são as marcas que vão permanecer
CARLOS MENDES

Muito barulho. Pouco resultado. Mais transpiração e pouca inspiração. As vozes do Fórum Social Mundial (FSM), preocupadas com seus problemas específicos - aliás, os mesmos problemas de todas as tribos do planeta -, provavelmente continuarão roucas, porque não serão ouvidas pelos governantes. Como expressão ideológica, os slogans e discursos de esquerda, ouvidos nas conferências, tendas e acampamentos, soam como aquelas músicas que tocam insistentemente no rádio até que ninguém mais aguenta ouvi-las. Os globalizados contra a globalização. É o rabo mordendo o cachorro.
No outro Fórum simultâneo, o de Davos, na Suíça, os donos do mundo homenagearam a crise global, cortando caviar e salmão da pauta de debates. Um deboche típico de quem vive em mundo diferente da maioria dos mortais. Em Davos é assim: os ricos se divertem à sua maneira, decidindo como os pobres irão pagar o pato da recessão. Barack Obama, que não foi a Davos, mergulhado até o pescoço na crise, deu o toque de indignação com meia dúzia de banqueiros que, indiferentes à quebradeira, embolsaram bônus de US$ 18 bilhões.
Ninguém chiou por aqui. Bem feito para os americanos, diriam alguns participantes do FSM. Em Belém, eles queriam somente demarcar terreno e, mais uma vez, botar a boca no mundo contra as injustiças praticadas pelos cínicos que cortam o caviar da ostentação, mas alimentam banqueiros vorazes com juros imorais em suas políticas econômicas. A utopia de um mundo melhor possível precisa continuar. Porque sem ela a vida não tem sentido.
O problema é que, debaixo da linha do Equador, mais duro que suportar o discurso repetitivo e messiânico de presidentes como Lula, Hugo Chaves, Evo Morales, Rafael Correa e Fernando Lugo, sempre batendo em capitalistas e banqueiros aos quais proporcionam vida mansa, é ver que no FSM as velhas teclas de outros fóruns foram reavivadas. As propostas são sempre as mesmas. Não mudam sequer uma vírgula.

PIQUENIQUE
O cientista social e mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (Uniceub), Paulo Roberto de Almeida, foi direto na mosca ao escrever sobre os objetivos do FSM. Irônico, ele diz em artigo: 'Os participantes podem congratular-se por serem os mais globalizados do planeta, porque desfrutam, provavelmente, de 100% de inclusão digital por meio da internet (sem considerar celulares e outros gadgets do mundo moderno), ou seja, fazem uma utilização plena das possibilidades abertas pela atual sociedade da informação'.
E mais: 'Todo o processo de informação preliminar sobre o FSM, de convocação e de mobilização preventivas, assim como o registro simultâneo e instantaneamente disseminado de suas ruidosas reuniões, colocadas (escusado dizer) sob o signo da antiglobalização, todo ele terá sido assegurado e efetivamente realizado 100% online, isto é, sob o signo do mundo virtual, que é praticamente um sinônimo da globalização'.
Para Almeida, os alegres participantes do piquenique anual da antiglobalização estão combatendo os próprios mecanismos que possibilitaram, viabilizaram e permitiram 'todas essas facilidades de informação, de comunicação e de interação recíproca'. E pergunta: 'Não é contraditório? Aliás, não parece completamente estapafúrdia essa revolta irracional contra os seus meios de expressão? Eu - como não pretendo usufruir de minha cota permitida
de ilogismo e de irracionalidade - respondo imediatamente que sim'. Faz sentido."


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