Pimenta disse...
Caríssima dona Maria Tereza,
Caríssima dona Maria Tereza,
No meu e-mail de 13 deste mês tive oportunidade de passar à senhora trecho de um artigo de autoria do biólogo e ambientalista João Paulo Capobianco, no qual ele fala justamente nos melhoramentos introduzidos no arsenal de medidas à disposição das autoridades para exercerem um controle melhor sobre a floresta amazónica. Mas, como disse naquela oportunidade, a tarefa é ciclópica. Ciclópica porque os obstáculos a serem transpostos envolvem um sem número de poderosíssimos interesses contraditórios que, no fundo, querem ter como verdade a ótica de cada um dos actores. E ciclópica porque a prática do que precisa ser feito esbarra na limitada capacidade de o país dispor do dinheiro suficiente para a gigantesca tarefa de policiar o território da Amazónia brasileira. Ao que se saiba, os países ricos que, por via transversa, poderiam ser beneficiados com a manutenção da floresta, porque ela é que os está fazendo respirar, conservam-se mudos e calados. Ao que sei, apenas a Noruega mostrou boa vontade em destacar recursos para tal empreendimento. O caso da saída de Marina Silva é emblemático para exibir essa luta de interesses. Segundo o portal Eco Debate, de responsabilidade do ambientalista Henrique Cortez, Marina se desentendeu com vários escalões do governo o mesmo tempo. Diz o portal: "um dos motivos que podem ter levado Marina Silva a ter decidido pedir demissão foi o fato de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter destinado a Roberto Mangabeira Unger, ministro da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, a coordenação do Plano Amazônia Sustentável (PAS). A nomeação teria sido a gota d'água. Marina vinha entrando em conflitos com outros ministérios, como a Casa Civil e a Agricultura. O mal-estar entre Marina Silva e Dilma Rousseff (Casa Civil) começou em Julho do ano passado, por conta das negociações em torno do edital para as concessões do leilão das usinas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira (RO). O impasse teve início com a cobrança do presidente Lula por mais agilidade nas licenças ambientais concedidas pelo Ministério do Ambiente. Após desentendimentos, o Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis) concedeu licença prévia para as hidrelétricas serem construídas, mas estabeleceu uma série de regras. Para Dilma, o argumento era económico e técnico: as usinas produzirão 6.450 MW - a maior obra de energia do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Marina argumentava, por outro lado, que as hidrelétricas só poderiam sair do papel se ficasse constatado que não iriam trazer prejuízos ambientais à região. Com o ministro Reinhold Stephanes (Agricultura), o desentendimento girava em torno do plantio de cana. Para Marina, Stephanes incentivava o plantio de cana na Amazônia, Pantanal e da mata Atlântica. Stephanes afirmou que foi mal interpretado. Marina também enfrentou problemas com os servidores do Ibama, insatisfeitos com a divisão do órgão e com a criação do Instituto Chico Mendes. A greve foi criticada por Lula."E a polêmica continua, desta vez com o novo Ministro do meio ambiente. Segundo diz o portal Eco Debate, em comentário de 11 deste mês, agora existem três frentes de luta:
l. "A pressa do governo para definir as novas regras para a produção de cana-de-açúcar na Amazónia e a instalação de 82 usinas termelétricas na região até 2017 transformaram-se na mais nova polémica envolvendo ministros de diferentes áreas do governo. O titular da pasta do Meio Ambiente, Carlos Minc, é contra a ampliação do número de usinas térmicas, principalmente as movidas a carvão e óleo diesel, por serem muito poluidoras. Ele também resiste à ampliação do número de áreas na Região Norte para o plantio de cana destinada à produção de álcool combustível por considerar a região imprópria para a atividade - por exigir grandes áreas desmatadas, além da queima do plantio na época da colheita. Matéria de Leonel Rocha, do Correio Braziliense, 10/02/2009. A produção de cana-de-açúcar na Amazónia e a instalação de usinas de álcool combustível na região vêm criando arestas entre os ministros do Meio Ambiente e da Agricultura, Reinhold Stephanes. Minc defende o que ele chama de etanol verde, o álcool combustível produzido dentro de regras ambientalmente correctas, como a colheita da cana sem a utilização de queimadas e o aproveitamento do vinhoto, o subproduto do etanol, como fertilizante, para evitar que seja jogado nos rios. "Nós teremos 5,5 milhões de hectares de cana, de áreas sem queimadas e aproveitando o vinhoto - que era jogado no rio - para fazer fertilizante", prometeu o ministro. Desde que assumiu o cargo, Stephanes defende uma maior destinação de áreas na Amazónia para o plantio de cana-de-açúcar. Ele argumenta que grandes áreas já desmatadas na região podem ser aproveitadas nesse tipo de plantio para a produção de álcool. Fontes do Ministério da Agricultura temem que as fortes restrições defendidas por Minc na aprovação do Zoneamento Económico Ecológico (ZEE) para a Região Norte possam conter ainda mais o crescimento da produção agrícola na região. Para todo o país, a previsão do Ministério da Agricultura é de uma queda de 8,4% no volume a ser colhido até o fim do ano - em comparação ao ano passado.
2. A outra frente de polémica do ministro Minc é com o seu colega de Minas e Energia, Edison Lobão. As novas termelétricas programadas para serem instaladas na Amazónia estão previstas no Plano Decenal de Expansão de Energia lançado pelo governo em Dezembro. Lobão defende a instalação das térmicas alegando que o país não pode correr o risco de ficar sem energia suficiente para manter o crescimento económico. Minc teme que, com tantas usinas poluidoras, o país possa adoptar uma política para o sector de energia contraditória ao Plano de Mudanças Climáticas anunciado pelo governo no ano passado.
3. Uma proposta de redução de prazos no rito para a emissão de licenças ambientais de grandes obras na Amazónia, em estudo pela Secretaria de Assuntos Estratégicos, criou uma terceira frente de polémica. Redigido em forma de minuta de decreto para ser assinado pelo presidente Lula, o texto altera o decreto original que estabelece as regras para a emissão de licenças de instalação e funcionamento das obras de infra-estrutura e desagradou ao ministro da área, que considera a mudança "desastrosa". Afinal, a floresta pode ou não pode conviver com todos esses interesses, cada um de per si? Será que a verdade de cada um actores será superior a uma verdade que contemple a verdade de um todo? Essa é a grande indagação.
SDS Pimenta (Belém Pará – BR)
23 de Fevereiro de 2009 0:27
23 de Fevereiro de 2009 0:27
Agradecimento do Lions Clube de Ponte de Lima
Obrigado, Caríssimo César Pimenta pelos seus sábios, oportunos e sempre interessantes testemunhos. O blog do Lions Clube de Ponte de Lima muito tem ganho com a informação que nos tem feito chegar. A Companheira Maria Teresa Correia tem tido muito interesse e entusiasmo por todas estas questões tão actuais quanto necessárias e pertinentes. Um obrigado grande.
Sérgio Araújo (Lions Clube de Ponte de Lima)
23 de Fevereiro de 2009 12:49
23 de Fevereiro de 2009 12:49
1 comentário:
13/02/2009
Amigos...
que terrível atentado à vida!
Quem pode ficar indiferente?
Sem precisar de palavras,
as imagens falam por si!
Quem ama, cuida...
"Temos que AMAR MAIS E MELHOR!"
CL Maria Teresa Correia
(Viseu - PT)
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Caríssima dona Maria Tereza,
O trabalho de contenção do desmatamento na Amazónia é uma actividade diuturna, uma guerra sem quartel, em que o sucesso está ligado a muita tecnologia, muito dinheiro e muita vontade para fazer o que deve ser feito, em contraposição aos gigantescos interesses daqueles que vêem a floresta como uma mina de ganhar dinheiro; ou daqueles que a vêem como um empecilho ao seu modo de ganhar dinheiro; ou ainda daqueles que a querem intocável e daqueles que a querem explorada tecnicamente; ou, mais ainda, daqueles que simplesmente a vêem como o seu ganha-pão.
Alguma coisa já foi alcançada nesse sentido, apesar de todas as dificuldades inerentes, muito embora ainda não se tenha chegado aos resultados que seriam de desejar.
João Paulo Ribeiro Capobianco, (biólogo e ambientalista, professor visitante da Universidade de Colômbia, Nova Iorque, e pesquisador associado do Instituto de Pesquisas da Amazónia (IPAM). Foi Secretário de Biodiversidade e Florestas e Secretário Executivo do Ministério do Meio Ambiente de 2003 a 2008), em artigo originalmente publicado em Clima em Revista, n° 9, Dez. de 2008/Jan. de 2009, publicação mensal on-line do IPAM, deixa uma ideia dos melhoramentos que foram introduzidos no arsenal de medidas de combate ao desmatamento.
Desse trabalho um trecho interessante pode ser ressaltado:
"Embora seja uma estimativa, pois o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) ainda não teve tempo hábil para examinar todas as mais de 200 imagens de satélite que cobrem a região, processo que só deverá estar concluído no final do primeiro semestre do próximo ano, sabemos que o desmatamento de 2008 ficou cerca 3,8% acima do de 2007. Considerando a margem de erro do sistema, o próprio Instituto afirma que o desmatamento pode ser considerado estável. É aí que surge a primeira pista de que há mais do que más notícias por trás destes números. Isso porque esta estabilidade é na realidade um facto novo e extremamente importante, face ao extraordinário crescimento da degradação florestal identificada no final do ano de 2007.
Aqui é importante um lembrete de carácter técnico. O desmatamento anual da Amazónia é medido de primeiro de Agosto de um ano a 31 de Julho do ano seguinte. Portanto, a estimativa de taxa de desmatamento ora divulgada começou a ser medida em Agosto de 2007 e foi fechada em 31 de Julho de 2008.
Durante quase duas décadas a partir de seu início em 1988, o monitoramento da cobertura florestal da Amazónia revelava fatos consumados. Ou seja, quando uma taxa era apresentada, significava que o dano já havia ocorrido. Era o que alguns chamavam de contabilidade da desgraça: ficávamos sabendo um ano ou dois anos depois, quanto havíamos perdido de floresta na região. Os dados, portanto, não podiam ser utilizados para actuar no sentido de reverter processos ou tendências de desmatamento em tempo de evitar ou minimizar o problema.
A partir de 2004 esta realidade começou a ser alterada com o lançamento do Deter (Detecção de Desmatamento em Tempo Real) um novo sistema desenvolvido pelo INPE para monitorar os indícios de alteração na cobertura florestal. O principal propósito desse sistema não é o de medir desmatamento, mas gerar ao longo do ano, através de relatórios quinzenais e mensais, informações de apoio à fiscalização ambiental por meio da emissão dos chamados alertas de desmatamento. No entanto, embora não tenha a precisão necessária para medir áreas, a dinâmica na geração desses alertas indica a situação na floresta. Se eles aparecem em grande quantidade há intensa pressão antropica e, portanto, tendência de mais desmatamento.
Foi exactamente isso que ocorreu em Outubro, Novembro e Dezembro de 2007. Ao contrário dos valores baixos que normalmente eram registrados nesses meses em anos anteriores, ouve um aumento atípico no número de alertas emitidos pelo Deter neste período. Este fato levou o Ministério do Meio Ambiente a propor ao Grupo Interministerial de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazónia uma série de novos instrumentos na busca de reverter a tendência de crescimento do desmatamento.
Entre as medidas propostas e aprovadas pelo presidente Lula, destacam-se a definição dos 36 municípios críticos e prioritários para a fiscalização; a obrigatoriedade do recadastramento dos imóveis rurais nestes municípios; o embargo administrativo das áreas ilegalmente desmatadas; a co-responsabilização de frigoríficos, empresas processadoras de grãos, serrarias e outras que utilizem como matéria-prima produtos oriundos de áreas embargadas; e, o condicionamento do crédito rural oferecido por banco público e privado à comprovação da regularidade ambiental do demandante.
Estas medidas foram intensamente combatidas por lideranças rurais nos estados da Amazónia e em Brasília, que as consideravam excessivamente duras. No afã de revertê-las, tentaram de tudo, inclusive desacreditar os números do INPE, o que levou a um histórico sobrevoo de uma delegação de ministros e técnicos do Governo Federal, acompanhada do próprio governador do Mato Grosso e assessores, sobre as áreas identificadas nas imagens do Deter.
Em Maio de 2008, após três meses de intenso bombardeio político, vários sinais indicavam que a pressão estava começando a surtir efeito no Palácio do Planalto, o que levou à renúncia da ministra Marina Silva e sua equipe, num ato extremo e vitorioso em defesa da manutenção das medidas.
Pois bem, o que se observa agora, após uma análise mais atenta dos números do Deter é que, assim como Outubro a Dezembro de 2007 foram atípicos por registrarem um aumento de alertas, os meses de Maio a Julho de 2008 também o foram, porém em sentido contrário: registraram uma forte queda em suas ocorrências. Ou seja, os meses que historicamente sempre registraram crescimento intenso no volume de áreas desmatadas, em função das condições climáticas favoráveis às queimadas e desmatamentos, registraram índices atípicos muito baixos.
Ainda será necessário realizar algumas análises aprofundadas para avaliar o peso específico das acções adoptadas pelo Governo Federal nesta abrupta redução. No entanto, uma primeira leitura da curva de evolução do preço da saca de soja e da arroba do boi gordo, nos mostrará que em Julho ambas as commodities alcançaram altas recordes. E, naquele momento, não havia nenhuma expectativa de que teríamos a crise de Wall Street.
De qualquer forma, independente das causas específicas, não há dúvida de que foi graças a essa redução que os números deste ano permaneceram estáveis em relação a 2007. Ou seja, mesmo sem obter uma desejada nova queda no desmatamento, foi possível evitar o pior.
Neste sentido, as boas notícias são exactamente estas. O Deter se consagrou como um sistema capaz de produzir dados de qualidade para avaliação de tendências. E, tão importante quanto isso, a experiência deste ano mostra que quando essas informações são levadas a sério e geram acções efectivas, é possível reverter processos antes considerados incontroláveis.
A dúvida a que me referi no início deste artigo é sobre os números do Deter, ainda não divulgados, de florestas que foram degradadas e, portanto, estão próximas de serem convertidas em corte raso. Essa é mais uma nova informação preciosa que o INPE poderá oferecer à sociedade brasileira a partir deste ano. Se o volume de áreas degradadas for muito grande, será preciso redobrar os esforços para contenção do desmatamento no período 2008-2009".
Como se vê, é extremamente complexa a tarefa de "cuidar da floresta" e espero que o trabalho de Capobianco tenha podido enriquecer ainda mais o seu conhecimento acerca desse fascinante e controverso tema.
SDS Pimenta
Belém - Pará (BR)
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(NOTA email acima: Cortesia de uma amigo - Cesar Pimenta - que me "descobriu" aquando do desempenho das minhas funções de Assessora da Campanha "Vamos Reflorestar Portugal", D115cn AL 2007/08.)
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